A 16ª conferência sobre biodiversidade das partes da convenção das nações unidas sobre diversidade biológica (COP 16) foi realizada de 21 de outubro a 1º de novembro de 2024, na vibrante cidade de Cali, na Colômbia
Este evento é um dos encontros mais significativos do mundo no que diz respeito à biodiversidade. Nele, líderes globais, organizações ambientais e ativistas se reuniram para discutir estratégias e compromissos essenciais para a proteção dos ecossistemas e a promoção da biodiversidade.
O tema deste ano, “Paz com a Natureza”, sublinha a urgência de estabelecer uma relação mais equilibrada entre os seres humanos e o meio ambiente. Nesse sentido, o principal objetivo da COP 16 foi desenvolver um plano de ação para implementar o Quadro Global de Biodiversidade de Kunming-Montreal, adotado na COP 15. Esse marco ambicioso tem como meta reverter a perda de biodiversidade e promover uma convivência harmônica entre a humanidade e a natureza, com estabelecimentos de objetivos claros para 2030 e 2050.
A biodiversidade da Colômbia e do Brasil
A Colômbia é reconhecida mundialmente por sua impressionante biodiversidade, sendo um dos países “megadiversos” do planeta. Com cerca de 10% de todas as espécies conhecidas do mundo, o país oferece um cenário ideal para sediar a conferência. Suas paisagens, que variam desde os Andes até a Amazônia, além das costas caribenhas e pacíficas, não apenas abrigam uma vasta gama de flora e fauna, mas também enfrentam desafios significativos na proteção desses recursos naturais.
Assim como a Colômbia, o Brasil é um dos países mais ricos em biodiversidade, abrigando cerca de 20% das espécies mundiais conhecidas, de acordo com o Ministério do Meio Ambiente. O país abriga dois hotspots de biodiversidade: a Mata Atlântica e o Cerrado, porém, muitas espécies estão ameaçadas devido à perda de habitat pelas queimadas e outros fatores. O Cerrado abriga 5% da biodiversidade do planeta, de acordo com a Embrapa, e possui mais de 4.800 espécies de plantas endêmicas, exclusivas desse hotspot, de acordo com o ICMBio.
Por outro lado, o Brasil é lar da maior floresta tropical do mundo, a Amazônia, e abriga ecossistemas únicos, como o Pantanal, que desempenham papéis essenciais na regulação climática e na preservação da biodiversidade global.
Um diálogo necessário e os resultados mais celebrados
A COP 16 representou uma oportunidade única para unir diversos setores, incluindo governos, organizações não governamentais e a sociedade civil, em um diálogo que busca não apenas a proteção da biodiversidade, mas também a promoção de uma sociedade mais justa e sustentável.
Além disso, os dois principais resultados mais celebrados da COP16 foram o estabelecimento do ‘Fundo Cali’ para o Compartilhamento de Benefícios de Informações Genéticas Digitais e o reforço do papel dos povos indígenas, afrodescendentes e comunidades locais nos esforços pela biodiversidade.
O Fundo Cali e o fortalecimento das comunidades
O Fundo Cali, decidido inicialmente na COP15, visa distribuir de forma justa os benefícios derivados do uso de Informações de Sequência Digital (DSI) de recursos genéticos. Durante a COP16, os delegados deram um passo significativo ao definir as bases de operacionalização desse fundo, essencial para que indústrias que lucram com DSI — como farmacêutica, biotecnologia, agricultura e pecuária — compartilhem os lucros com países em desenvolvimento, povos indígenas e comunidades locais. Empresas beneficiárias devem contribuir ao fundo com uma parcela de suas receitas, enquanto entidades acadêmicas e de pesquisa pública, que não têm fins lucrativos, ficam isentas.
O papel das comunidades na conservação
No que diz respeito ao fortalecimento do papel dos povos indígenas e comunidades locais, a COP16 aprovou um novo Programa de Trabalho sobre o Artigo 8(j), incluindo os afrodescendentes, que reforça a importância desses grupos na implementação dos três objetivos da Convenção sobre a Diversidade Biológica: conservação, uso sustentável e compartilhamento justo dos benefícios da biodiversidade, além da execução do Quadro Global de Biodiversidade de Kunming-Montreal.
Os desdobramentos da COP16 destacam uma necessidade crescente para que as empresas divulguem de forma completa e transparente seus riscos e impactos sobre a biodiversidade. Esse cenário exige um compromisso genuíno com iniciativas que promovam impactos positivos na preservação ambiental, já que a sustentabilidade dos recursos naturais é fundamental não só para a vida, mas também para a viabilidade dos negócios a longo prazo.
Integração de agendas de sustentabilidade
Nesse contexto, iniciativas como o TNFD (Taskforce on Nature-related Financial Disclosures) estão ganhando relevância, complementando o papel já estabelecido do TCFD (Taskforce on Climate-related Financial Disclosures) para questões climáticas. Essa integração das agendas de sustentabilidade está promovendo mudanças profundas no setor corporativo e na evolução da agenda ESG.
Diversas empresas, impulsionadas pela pressão de investidores e reguladores, estão ampliando suas estratégias para incorporar metas de preservação da biodiversidade, além dos já conhecidos compromissos de redução de emissões. Isso inclui compromissos com proteção de espécies, restauração de áreas degradadas e ecossistemas, com desmatamento zero, entre outras soluções baseadas na natureza. Há uma crescente demanda por transparência ampliada sobre os riscos e impactos ambientais, não apenas climáticos, mas também relativos à biodiversidade.
Destaques em sustentabilidade e estratégia de impacto
No contexto das discussões e parcerias fomentadas pela COP 16, algumas personalidades de destaque enriqueceram o debate sobre estratégias e práticas sustentáveis. Entre as mulheres inspiradoras do evento, esteve presente Bruna Soares Mesquita, engenheira com pós-graduação em economia circular e desenvolvimento sustentável. Com 12 anos de experiência em uma multinacional francesa, Bruna já atuou nas áreas financeira, comercial e de progresso e, hoje, é gerente de sustentabilidade da Michelin para a América do Sul, onde lidera projetos socioambientais de impacto.
Outro nome de peso no encontro foi Andréa F. T. Álvares, que tem três décadas de atuação profissional, sendo 27 anos dedicados a grandes empresas de bens de consumo, como Natura, Pepsico e P&G. Andréa foi vice-presidente global de marca, inovação e sustentabilidade da Natura e, atualmente, é líder do fundo de investimentos FamaGaia Sociobioeconomia. Com uma carreira marcada pelo compromisso com a sustentabilidade, Andréa também contribui em diversos conselhos e instituições, incluindo o Instituto Ethos, e desenvolve sistemas regenerativos com sua empresa, a Camomila.
Outra mulher referência na área é Hannah Simmons, fundadora e CEO da ERA (Ecosystem Regeneration Associates), uma organização liderada por mulheres que desenvolvem projetos de soluções baseadas na natureza no Brasil. Hannah liderou o desenvolvimento do primeiro projeto de conservação de carbono REDD+ no Cerrado, protegendo mais de 11 mil hectares. Além disso, ela é bacharel em Economia Ambiental e Sustentabilidade pela Universidade McGill, no Canadá, e atua no Brasil há mais de 10 anos. Por meio de sua empresa, a ERA também desenvolveu os primeiros créditos de biodiversidade do Brasil no Regen Registry, em parceria com o Instituto Homem Pantaneiro (IHP) — uma ONG brasileira — protegendo 50 mil hectares de habitat de onças-pintadas.
Além disso, Hannah está profundamente envolvida na agenda de empoderamento feminino, tendo desenvolvido os primeiros créditos sociais usando o padrão W+ para medir e verificar os resultados do programa de treinamento em agrofloresta da ERA voltado para mulheres. Hannah acredita que o setor privado tem um papel fundamental no financiamento de uma transição justa para um futuro de emissões líquidas zero e positivo para a natureza.
Outra mulher que se destaca nesse ramo é a Carina Pimenta, Secretária Nacional de Bioeconomia do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima, onde é responsável pela implementação de políticas públicas de bioeconomia, pagamento por serviços ambientais, gestão do patrimônio genético e gestão compartilhada dos recursos pesqueiros. Carina é formada em Administração de Empresas pela Escola de Administração de São Paulo e possui mestrado em Desenvolvimento Social pela Universidade de Sussex. Em 2018, cofundou o Instituto Conexões Sustentáveis (Conexsus). É Fellow da Skoll Foundation, onde recebeu o prêmio de inovação social pelo trabalho realizado com negócios comunitários e instrumentos financeiros voltados à sociobiodiversidade brasileira. Além disso, foi uma voz muito atuante durante as negociações da COP16.
Convidamos essas quatro mulheres para participar de uma conversa sobre o tema no nosso Hubcast. Além disso, escolhemos trazer os aprendizados da COP 16, por meio das entrevistas concedidas por essas profissionais, como exemplos de iniciativas em andamento na agenda de biodiversidade do país. Elas também ilustram o papel transformador que as lideranças empresariais podem desempenhar em prol da biodiversidade e da sustentabilidade, ajudando a moldar o futuro que a Conferência busca construir.
Rosana Rezende foi parceira do Impact Hub Brasília na realização destas conversas diretamente de Cali, Colômbia, mediando esse bate-papo. Além disso, Rosana é bióloga com especialização em Educação Ambiental e mestrado em Ciências Florestais com foco em Manejo e Conservação de Recursos Naturais. Com ampla experiência em gestão de projetos socioambientais e implementação de processos regenerativos, atuou em instituições de pesquisa, órgãos governamentais, ONGs e no setor privado, passando por instituições como Embrapa, Ministério do Meio Ambiente, MRS Logística e WWF Brasil. Desde 2019, trabalha focada na sistematização de informações, consultoria em sustentabilidade e facilitação de processos participativos. Assim, teve como parceiros na execução de projetos e ações: Nous Ecossistema, Impact Hub Brasília, Conexsus, Sense Lab e Mandalah; onde ofertaram serviços à: Bauducco, Instituto Socioambiental – ISA, Arcelor Mittal, GIZ, Associação Garupa, entre outros. É professora convidada no Programa ESG-COOP da Escola de Negócios da PUCPR e apoia, como mentora, programas como Women in Food and Agriculture, Global Citizen Year, InovAtiva e SaltoAceleradora.
Confira como foram os episódios do Hubcast entrevistando essas quatro mulheres que são referência na área: